domingo, 24 de fevereiro de 2008

Haig Khatchadourian, "A Moralidade do Terrorismo" (Parte II)

Embora defenda que esta e outras definições similares de “terrorismo” sejam inadequadas, Lackey tem razão em recusar a definição da Força de Intervenção Rápida ao Terrorismo do actual Vice-Presidente de George Bush, segundo a qual o terrorismo é “o uso ilegítimo da violência contra as pessoas e a propriedade para alcançar objectivos sociais e políticos”.[1]
Esta definição, observa Lackey, é demasiado abrangente, só que a sua própria definição, embora tenha o mérito de não confinar as vítimas do terrorismo aos civis, padece do efeito contrário. Um outro exemplo de uma definição demasiado abrangente é dada pela Força de Intervenção Rápida, a saber, “a ameaça ou o uso efectivo de força ou violência para obter um fim político através do medo, da coerção ou da intimidação”[2]. Esta definição, tal como outras que foram propostas, partilha um defeito fundamental que será exposto à medida que avançarmos.
Outras definições propostas que examinei
[3] revelaram-se também ou demasiado abrangentes ou demasiado restritas, ou ambas – um problema que as definições “essencialistas” geralmente enfrentam – para além de existirem, muitas vezes, outros problemas. Algumas definições são demasiado restritivas, estando limitadas a uma forma de terrorismo, por exemplo, ao terrorismo político segundo o significado restrito e usual do termo[4]. Há ainda outras definições ou caracterizações que falham por serem mais ou menos abertamente normativas (condenatórias) em vez de, como deve ser, serem neutras e não avaliativas. Na declaração do antigo Presidente Ronald Regan sobre o terrorismo afirma-se que este corresponde à mutilação e à morte deliberada de pessoas inocentes, e a sua caracterização dos terroristas como “puros criminosos” deixa claramente de lado as questões éticas[5]. Uma definição mais completa, mas que sofre do mesmo defeito foi proposta por Burton Leiser. Eis uma parte da sua definição[6]:

O terrorismo corresponde a qualquer conjunto organizado de actos de violência concebidos para destruir a estrutura da autoridade que normalmente zela pela segurança, ou para reforçar ou perpetuar um regime governamental cujo apoio popular é problemático. É uma política de morte, assassínio, sabotagem, subversão, roubo e outras formas de violência aparentemente sem sentido, irracionais e arbitrárias, cometidas com uma dedicada indiferença relativamente aos códigos legais e morais existentes ou com pretensões a reclamar uma isenção especial às normas sociais convencionais.

[1] “Relatório da Força de Intervenção Rápida ao Terrorismo do Vice.Presidente”, in Lackey, Ethics, 85.
[2] Charles A. Russell et al, “Reinventando o Terrorismo”, in Terrorism, Theory and Practice, Yonah Alexander e tal, eds, (Boulder, CO, 1979), 4. Na nota 2, p. 37, os autores acrescentam: «O ”político” é compreendido nesta acepção para se referir ao âmbito total dos factores sociais, económicos, religiosos, étnicos, e governamentais que têm impacto num corpo político, enfatizando as noções de poder e influência. A definição ideal é tal que tanto os que aceitam o terrorismo como os que o abominam concordam”.
[3] De acordo com Leonard B. Weinberg e Paul Davis, Introduction to Political Terrorism (New York, 1989), 3, foram propostas mais de uma centena de definições diferentes por diferentes analistas ao longo dos tempos. Ver ainda Harold J. Vetter et al, Perspectives on Terrorism (Pacific Grove, 1990), 3, onde se afirma que as definições foram propostas entre 1936 e 1983.
[4] Por exemplo, a definição de Weinberg e Davis na sua Introduction, 3 e seguintes.
[5] Citado por H. Khatchadourian, "Terrorism and Morality”, Journal of Applied Philosophy, 5, nº 2 (Outubro 1988): 131.
[6] Burton M. Leiser, Liberty, Justice, and Morals (New York, 1979), 375. Em itálico no original.

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